29 junho, 2005

Tomem nota - Aos amantes da sétima arte






Esta é para os amantes da sétima arte. Ao nosso alcance uma filmografia a serviço da estética, das boas e novas idéias, das discussões,da sinuosidade dos traços e de muita inspiração surreal: o sonho, a fantasia, o grotesco, os não-atores, nós. Com estilo marcante, ora ácido, ora melancólico; o estilo “felliniano” de retratar, pensar, imaginar.

Acontece em Brasília, mais especificamente no Conjunto Cultural da Caixa, a Mostra Circo Fellini. É uma retrospectiva do artista Frederico Fellini, um dos mais cultuados cineastas atualmente. Serão exibidos 20 filmes até o dia 24 de julho, ou seja, quase todas as obras dele. E para assistir nostalgicamente a esses filmes de qualidade não custa caro, ou melhor, não custa nada: a entrada é franca. Haverá um filme por dia, sempre às 12h, 15h e 18h. Vale conferir, também, a exposição com outras obras do diretor, como fotografias e desenhos.

Programação

Mulheres e Luzes - Luci del varietà (1950)100min. Dias: 10/06 e 03/07
Abismo de um Sonho - Lo Sceicco Bianco (1952)90min. Dias: 11/06 e 05/07
Os Boas Vidas - Il Vitteloni (1953)100min. Dias: 12/06 e 06/07
A Estrada da Vida - La Strada (1954)100min. Dias: 14/06 e 07/07
A Trapaça - Il Bidone (1955)100min. Dias: 15/06 e 08/07
As Noites de Cabíria - La Notti di Cabiria (1957)120min. Dias: 16/06 e 09/07
A Doce Vida - La Dolce Vita (1960)180min. Dias: 17/06 e 10/07
Boccaccio 70 - Boccaccio '70 (1961)180min. Dias: 18/06 e 12/07
8 ½ - 8 ½ (1962)120min. Dias: 19/06 e 13/07
Julieta dos Espíritos - Giulietta degli Spiriti (1965)120min. Dias: 21/06 e 14/07
Histórias Extraordinárias - Histoires Extraordinaires (1968)120min. Dias: 22/06 e 15/07
Satyricon - Fellini Satyricon (1969)140min. Dias: 23/06 e 16/07
Roma de Fellini - Rome di Fellini (1972)120min. Dias: 24/06 e 17/07
Amarcord - Amarcord (1974)120min. Dias: 25/06 e 18/07
Ensaio de Orquestra - Prova d'Orchestra (1979)70min. Dias: 26/06 e 20/07
A Cidade das Mulheres - La Città delle Donne (1980)150min. Dias: 28/06 e 21/07
E La Nave Vá - E La Nave Va (1983)130min. Dias: 29/06 e 22/07
Ginger e Fred - Ginger e Fred (1985)120min. Dias: 30/06 e 23/07
Entrevista - Intervista (1986)120min. Dias: 01/07 e 24/07
A Voz da Lua - La Voce della Luna (1990)120min. Dias: 02/07

27 junho, 2005

O á-bê-cê da política e o blá, blá, blá da imprensa



Já perceberam que ao se remeter às mulheres políticas a mídia sempre dá ênfase às características físicas, às roupas, à vida particular delas, sobretudo a amorosa? Cria-se uma “aura feminina” que as inabilitam para o exercício da política. Assim como Marconville em meados do séc. XVI, a imprensa tenta nos convencer de que as mulheres não têm aptidões para manejar e conduzir “coisas grandes e difíceis como costumes, religião, república e família, pois parecem ter sido feitas mais para a volúpia e o ócio que para tratar negócios de importância”. Assim aconteceu com Martha Suplicy, com Patrícia Saboya e com outras tantas. Agora, a mulher da vez é Dilma Rousseff.

Em uma das muitas leituras sobre a sua posse na Casa Civil, deparei-me com uma matéria que dizia: “Usava um terninho marrom claro, blusa branca, colar e brinco de pérolas combinando. O cabelo muito bem arrumado mostrava que a ministra tinha acordado cedo para se produzir. Na cerimônia de posse ainda estava impecável, mesmo com sua equipe garantindo que ela não deu nenhuma escapulida para ajeitar o cabelo durante o dia”. Ora, de que interessa aos leitores ávidos por informação as roupas, mais que normais, que a ministra usava? E no final, completou: “estava visivelmente nervosa durante seu discurso”. Sobre o seu histórico político, profissional e de militância nem uma linha sequer.


Na cultura política brasileira, há uma divisão entre masculino político e feminino social. Os adjetivos e as análises da imprensa sobre a escolha de Dilma Rosseff para a chefia da Casa Civil são os mesmos. Chega a ser enfadonha, cansativa, a falta de criatividade e a recorrente utilização de estereótipos para definir a futura atuação da primeira mulher a chegar a tão alto cargo no poder Executivo deste País. “Um perfil mais gerencial e menos político”. Não se fala outra coisa.

Mas o alcance do preconceito é bem maior. Escorregadas até na própria Esplanada dos Ministérios. Lá, como no resto do país, a política ainda é vista como santuário masculino, um espaço de virilidade que repele a dita “feminilidade”. O ministro da Cultura, Gilberto Gil, cantou aos quatro ventos, ou melhor, aos quatro poderes, que Dilma Rousseff, ex-ministra de Minas e Energia, "tem uma personalidade forte, um lado macho na forma de imprimir gestão". Segundo ele, "a expectativa geral da política e da sociedade brasileira é que governantes têm de ser muito machos".

Essa “virilidade”, a que se refere Gilberto Gil, não é senão a eficácia da ministra em enfrentar um desafio colossal, até mesmo épico:reformular o setor eletro-energético brasileiro e assegurar o planejamento da sua expansão com o incentivo de novos investimentos para evitar crises como o “apagão” enfrentado pelo país entre 2001 e 2002, além de instituir tarifas mais justas. Ações que não são sinônimos de masculinidade e sim de muita competência.

23 junho, 2005

O estrelato e seus protótipos de semideuses



É incrível como alcançar papéis de destaque (ou não) no horário nobre pode transformar um ignóbil alienado num pseudo-intelectual de enfeite com legitimidade para discursar. Tudo pelo ar-da-graça-global. Explico-me. Nesse fim de semana que passou, no dia 18 de junho mais especificamente, a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres promoveu o segundo Seminário Mídia e Mulher, lá em Sampa. O objetivo maior era debater a representação das mulheres na teledramaturgia, no jornalismo e na publicidade. Pois bem. Para compor a primeira mesa, foram convidadas as atrizes Tássia Camargo, Ingrid Guimarães e a escritora Fernanda Young. Engajamento, nenhum. Argumentos, fracos e superficiais, às vezes nem isso. E doses cavalares de auto-promoção. Nunca ouvi tanta bizantinice em tão curto espaço de tempo.

Ingrid Guimarães, ex-Confissões de Adolescentes e atualmente fazendo o papel de balzaca-desesperada-por-homem em Sob Nova Direção, promoveu sua peça, destacou que só era chamada pra fazer papel de dragão (por que será?), reforçou o estereótipo de que mulher bonita é necessariamente burra e que ela prefere ser a “inteligente” e finalmente desconstruiu a única coisa notável que já fez: os debates acalorados sobre aborto e drogas na peça voltada para os recém-egressos da infância.

Tássia Camargo – o último papel que fez foi de uma lavadeira em o Cravo e a Rosa –, ao defender a Globo, após uma crítica sobre à sexualidade exarcebada na emissora, disse que era pobre, comeu pão mofado (salientado por ela), assistia muito à TV e que nunca fumou, nem engravidou. Não precisa dizer nada, né?

Por fim, Fernanda Young, debatedora do Saia Justa e escritora d’Os Normais, auto-definida como moderninha, diferente e aquela que odeia estereótipos, reforçou todos eles. Em especial no que dizia respeito às mulheres, tema da discussão. Para ela, construir um arquétipo de mulher louca, histérica e desequilibrada é utilizar um recurso poético. É mole? Poesia agora significa preconceito, patriarcalismo e hierarquização dos sexos?

Nossos debates sem profundidade, a percepção estreita do mundo, os preconceitos, os modos de ser, agir, pensar, vestir, falar são, cada vez mais, reflexos dos intervalos entre um Plim-Plim e outro. Abaixo a televisão! Abaixo os globais sem conteúdo nos espaços de fala. E já que a literatura é uma expedição à verdade, façamos uma ode aos livros. Diga-se de passagem, aos bons livros, porque, como já dizia Schopenhauer, leituras ruins podem transformar um sábio num tolo.


22 junho, 2005

Manifesto contra propaganda machista



Desde o início do século XX, a revista Cláudia reforça os estereótipos de gênero e coloca as mulheres numa posição de submissão, inferioridade, domesticidade e debilidade tanto física como intelectual. Exemplo de uma pérola: “Se desconfiar da infidelidade do marido, a esposa deve redobrar seu carinho e provas de afeto” (Revista Cláudia, 1962).

Em pleno séc. XXI, esse periódico, que possui cerca de 2,4 milhões de leitoras/os, tenta homogeneizar o "ser mulher”, desenhando o perfil das verdadeiras mulheres, que acabam por ser resumidas em meras consumidoras, fazendo funcionar poderosos setores industriais ligados às suas características "naturais": domesticidade, sedução e reprodução e futilidades (SWAIN).

Na sua nova propaganda, que teve um investimento de R$ 4,7 milhões, a revista Cláudia nos diz que a independência, para as mulheres, se resume a fazer comida com maior facilidade, no seu devido lugar: a cozinha. Com o slogan: “Ser independente sem deixar de ser mulher”, dito logo após uma mulher se remeter ao companheiro para que ele abra um pote, fingindo não ter conseguido fazê-lo, só reforça a idéia de que mulheres e homens devem continuar a ocupar lugares tradicionalmente traçados segundo sua "natureza" feminina ou masculina, "natureza" essa desconstruída pelo feminismo.

Essa publicidade quer dizer que para ser uma verdadeira mulher é preciso se mostrar frágil, dependente, submissa, bela e ainda ser a responsável pelos afazeres domésticos, enquanto o homem é representado como forte, independente e intelectualizado, já que ele utiliza um laptop enquanto ela cozinha.

Além disso, como afirma a doutora em história Tânia Swain, a ausência, nas revistas femininas, de debate político, de assuntos econômico-finaceiros, das estratégias e objetivos sociais, das questões jurídicas e opinativas é extremamente expressiva quanto à participação presumida, à capacidade de discussão e criação, ao próprio nível intelectual das mulheres que as compram.

Neguemos os estereótipos, as discriminações e a medicalização do discurso contra as mulheres: vamos fazer uma corrente nacional de boicote à Revista Cláudia, que nos quer afrontar a inteligência e pretende relegar as mulheres a papéis secundários, “biologizantes” e inferiores. Manifeste-se também junto a amigas/os, ao CONAR, ao DPDC, aos sites e à própria revista.